Eu sou grego.
E se de repente os sulistas europeus deixassem de serem “Charlie”
e passassem a serem gregos. Será isso verosímil? Hummmm …Penso que (ainda) não!
As recentes eleições na Grécia deram a vitória a uma
organização política tida como da esquerda radical (seja lá isso o que for). Mais
importante do que a catalogação do Syriza, é saber retirar da opção grega a
leitura política que se impõe: numa Europa que diz querer rejeitar qualquer
tipo de radicalismo (religioso, político ou outro) e que se vê agora
confrontada com uma Grécia protagonista de uma política de cariz radical, dá
que pensar e requer cuidados especiais de análise. Enfim, há duas semanas atrás
repudiávamos radicalismos e todos éramos “Charlie”
Estou convencido que o voto radical dos gregos não é um voto
ideológico mas sim um voto de protesto, um voto que traduz um “Basta!” na
submissão aos fortes, poderosos (e ricos) predadores do norte europeu.
Será que a nação grega caiu na esparrela de um populismo
barato, ou será que acreditou convictamente que é possível acabar com a
austeridade e ganhar a soberania sem sair da União Europeia e Zona Euro?
A soberania é coisa que os países, ou melhor os Estados
Membros, abdicaram há muito a troco dos fáceis Euros oriundos dos parceiros contribuintes
líquidos. Nessa bebedeira de aparente abundância a Grécia, tal como Portugal,
Espanha e outros “sulistas”, de uma forma mais ou menos irresponsável deixaram-se
levar para uma dívida pública com contornos surreais.
E é isso. O cerne da questão são as dívidas soberanas e as espectativas
do seu pagamento. Isto é, é uma simples questão de se ter ou não dinheiro! E a
Grécia não o tem. Por isso Tsipras clama por um imediato perdão parcial da
dívida grega ao mesmo tempo que exige a manutenção do financiamento europeu. Só
que agora, não é apenas o sector privado a arcar com o ónus do perdão (tal como
aconteceu no primeiro perdão de cerca de 100 mil milhões de euros e que levou à
rutura de parte do sistema financeiro europeu com especial relevo para o
Chipre). Um novo perdão da dívida grega será feito à custa do orçamento dos
outros Estados Membro incluindo Portugal, Espanha, Itália e França.
Será que, para satisfazer a Grécia de Tsipras e a sua idílica
luta anti austeridade, estarão os restantes povos europeus dispostos a
financiar o estado helénico e a exibir publicamente e com orgulho o cartaz “Je
suis Grec” ou (se o Google Translator não se enganar) “Είμαι ελληνικά”?
O tempo o dirá.
Rui Pereira de Freitas