terça-feira, 29 de abril de 2014




Casa onde não há pão …

Não há muito tempo que sentíamo-nos todos abafados pelo confortável manto que as bebedeiras da abundância sugeriam e concretizavam. Agora é diferente. Muito diferente.
De um momento para outro, o mar abundante das coisas úteis e inúteis simplesmente desapareceu. Transmutou-se num raquítico lago onde nos é apenas possível pescar o estritamente necessário. Acabou-se o supérfluo, terminaram os pequenos luxos.

Nas últimas décadas assistimos, indiferentes, ao primado do achincalhamento sobre as dinâmicas das virtudes e dos valores democráticos. Assistimos, sem nos apoquentar, ao atropelo sistemático da ética humanista e ao escarnecer das legítimas diferenças que os outros apresentavam. Na verdade, a aparente abundância em que vivíamos, entorpecia o nosso juízo crítico e reforçava a nossa ingénua crença na bondade das lideranças políticas.
Entre a falência do Lehman Brothers e a humilhante sujeição da Região a um PAEF, foi um instante.

A nova realidade socioeconómica surgiu de sopapo. Estalou-nos na cara com estrondo. Instintivamente procurámos um culpado e uma solução. Os protagonistas políticos deram-nos uns e apresentaram outras. Confundiram o povo e este começou a dar sinais de revolta.
Entretanto surgiram as Autárquicas e foi o que se viu! Um novo mapa político foi desenhado a nível local. Os derrotados deram murros na mesa e soltaram impropérios. Os vencedores, alguns verdadeiramente surpresos com o próprio sucesso, angustiaram-se com o que fazer face ao imbróglio que os votos lhes colocaram nos braços.

Num sistema político estruturado e alicerçado numa serôdia traficância de cargos e negócios, a derrocada financeira e o fechar da torneira dos fáceis euros, deixou cada vez mais pessoas fora do banquete e da bebedeira. Os descontentes passaram agora à procura de novo protagonista que lhes dê alento e esperança (e benesses). Procura essa, que cria invejas, ciúmes e desentendimentos entre os anteriores amigos e dependentes. Afiam-se facas, contam-se espingardas, idolatram-se "Delfins".
Diz o povo, e com razão: Casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão.

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