Casa onde
não há pão …
Não há muito tempo que
sentíamo-nos todos abafados pelo confortável manto que as bebedeiras da
abundância sugeriam e concretizavam. Agora é diferente. Muito diferente.
De um momento para outro, o mar
abundante das coisas úteis e inúteis simplesmente desapareceu. Transmutou-se
num raquítico lago onde nos é apenas possível pescar o estritamente necessário.
Acabou-se o supérfluo, terminaram os pequenos luxos.
Nas últimas décadas assistimos,
indiferentes, ao primado do achincalhamento sobre as dinâmicas das virtudes e
dos valores democráticos. Assistimos, sem nos apoquentar, ao atropelo
sistemático da ética humanista e ao escarnecer das legítimas diferenças que os outros
apresentavam. Na verdade, a aparente abundância em que vivíamos, entorpecia o
nosso juízo crítico e reforçava a nossa ingénua crença na bondade das
lideranças políticas.
Entre a falência do Lehman Brothers e a humilhante sujeição da
Região a um PAEF, foi um instante.
A nova realidade socioeconómica surgiu de sopapo. Estalou-nos na cara com
estrondo. Instintivamente procurámos um culpado e uma solução. Os protagonistas
políticos deram-nos uns e apresentaram outras. Confundiram o povo e este
começou a dar sinais de revolta.
Entretanto surgiram as Autárquicas e foi o que se viu! Um novo mapa
político foi desenhado a nível local. Os derrotados deram murros na mesa e
soltaram impropérios. Os vencedores, alguns verdadeiramente surpresos com o
próprio sucesso, angustiaram-se com o que fazer face ao imbróglio que os votos
lhes colocaram nos braços.
Num sistema político estruturado e alicerçado numa serôdia traficância de
cargos e negócios, a derrocada financeira e o fechar da torneira dos fáceis
euros, deixou cada vez mais pessoas fora do banquete e da bebedeira. Os
descontentes passaram agora à procura de novo protagonista que lhes dê alento e
esperança (e benesses). Procura essa, que cria invejas, ciúmes e
desentendimentos entre os anteriores amigos e dependentes. Afiam-se facas, contam-se espingardas, idolatram-se "Delfins".
Diz o povo, e com razão: Casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem
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