segunda-feira, 22 de julho de 2019


A política, os políticos, e o “Eu real versus o Eu Ideal

Na política, como na vida, é comum haver uma franca dissonância entre aquilo que efetivamente se é e aquilo que se gostaria de ser. É por isso que, quando as coisas não correm de feição, os políticos tendem a encontrar soluções internas, no seu “Eu Interior”, para superar a frustração de não terem conseguido atingir na plenitude os objetivos primordiais a que se prepuseram e que submeteram a sufrágio.

É aí que os ditos políticos começam, lentamente e no seu íntimo, a ceder espaço para que o seu Eu Ideal se sobreponha ao seu Eu Real. Trata-se de uma fantasia irrealizável, mas que promete ao político a tão desejada paz interior.

O Eu idealizado necessita de atingir a glória, repleto de projetos políticos demagógicos e inacessíveis, tal a perfeição humana que pretende alcançar. Para conquistar a glória o Eu Ideal faz exigências descabidas ao fragilizado Eu Real, exigências essas que se robustecem através daquilo a que se apelidou de “tirania do  dever” – uma trama mais ou menos inconsciente que obriga o político a seguir normas de conduta rígidas e irrealizáveis. E para tornar firme essa tirania do dever, desenvolve um orgulho exacerbado, ao mesmo tempo que, paradoxalmente, cria um sistema de desprezo por si mesmo que o afasta ainda mais do seu Eu Real.


Essas exigências idealizadas tornam-se normalmente insuportáveis para o político, que lança mão de medidas gerais para aliviar a tensão. Entre estas estratégias estão as soluções expansivas, através da sedução e do domínio. Quando predomina esta tentativa de solução, o Eu idealizado do político pretende consolidar o domínio sobre as demais pessoas, como forma de mantê-las controladas e distantes de si.

Por outro lado, quando adota uma solução autoanuladora, o político elege o amor como o caminho de sua paz interior. E neste caso, torna-se morbidamente dependente de outras pessoas, que se transformam em seu auxiliar mágico, com capacidade para ampará-lo e resolver seus conflitos interiores.

A terceira tentativa de solução do político é a sedução da liberdade, através da qual pretende alhear-se da sociedade onde vive, e manter-se impermeável numa redoma de tranquilidade.

Mas como nenhuma destas soluções idealizadas se completam, o político passa a viver não apenas perturbado pelos seus conflitos interiores, mas também com sérias dificuldades nas relações com os seus pares, pois o fracasso em realizar seu Eu Ideal é exteriorizado e a responsabilidade passa a recair, inevitavelmente,  sobre as pessoas com quem habitualmente se relaciona: na realidade, se expansivo não consegue dominar as pessoas do seu convívio, se dependente mórbido, não encontra o seu auxiliar mágico perfeito, e se resignado, não consegue suficiente distanciamento do mundo para viver em paz.

Assim, e em fase de campanha eleitoral, estou em crer que o desejável para o bem comum, seria o que o sufocado Eu Real lentamente renascesse na sua luta contra o Eu Ideal, de forma a devolver definitivamente aos políticos a respetiva sanidade existencial. Nem que fosse necessário recorrer a ajuda profissional!

Rui Pereira de Freitas

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